terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Amor sem escalas ou vida sem escalas? - sobre "mochilas" mais leves, solidão e companhia


No último fim-de-semana fui assistir “Amor Sem Escalas” (Up in the Air), com o galã e bom ator George Clooney (Ryan Bingham). A princípio achei que seria mais um filme-pipoca, ou seja, um belo passatempo sem maiores pretensões, que nos estimula a sair de casa pelo simples prazer de ir ao cinema. Um ritual que eu duvido muito que um dia se extinguirá, a despeito das más línguas desinformadas.

Mas eis que surge no telão um filme intrigante, com vários diálogos bem articulados e inteligentes, e o melhor: com um fino e irônico humor, raro nos filmes da atualidade. O filme inclusive tem um roteiro muito interessante e peculiar: Clooney é funcionário exemplar de uma empresa norte-americana especializada em demitir pessoas (sim, isso já existe, meus caros).

Sua profissão exige que ele passe mais dias de sua vida entre aviões, hotéis e aeroportos do que em terra firme, no seu lar em Omaha, que consiste em um mini-flat sem itens básicos para a sobrevivência, já que Clooney pouco fica lá. Possui também um objetivo de vida deveras inusitado: acumular 10 milhões de milhas aéreas, feito alcançado até então apenas por seis privilegiados. Não preciso nem comentar que ele é Cliente Premium dos principais programas de fidelidade.

Além disso, é um solteiro convicto, que pouco se importa com sua família que inclui irmã e sobrinha, e gosta de ressaltar os prazeres do desapego e do individualismo através de palestras motivacionais sobre como fazer uma mochila ficar o mais leve possível de forma física e conceitual. Aliás, esse é um ponto de destaque do filme, já que em tais palestras ele realiza interessantes comparações com a vida para convencer seus espectadores a deixarem para trás elementos supérfluos, que só deixariam suas malas mais pesadas em vão.

Defende o desapego em última instância para que a mochila e também a vida da pessoa fique mais leve e possa se “movimentar”, termo que ele utiliza várias vezes. Embora seja radical demais o modo como ele prega tal desapego, a verdade é que também boa parte do que ele diz faz muito sentido, se formos pensar de maneira prática.


Quantas vezes já não nos vimos carregando pesados fardos na nossa vida, por resignação ou hábito? Como é difícil às vezes nos livrarmos de certas manias e situações que não nos agregam em nada por mero comodismo ou porque todo ser humano não deixa de carregar consigo um certo grau de masoquismo, um certo prazer na auto-punição? Que tal uma meditação transcendental para refletir sobre como você pode deixar mais leve a sua “mochila”?

Depois de muitas reviravoltas interessantes no filme, que eu não vou contar para não ser apedrejada, mas que inclui a tal da descoberta do amor presente no título, já quase no final da “película” surge um grande desafio para Clooney. No dia do casamento de sua sobrinha, minutos antes da cerimônia, o noivo desiste de casar em função de uma repentina crise existencial.

Na sua crise, o noivo começa a questionar Clooney sobre o sentido do casamento, já que a vida que ele leva parece ser muito mais feliz e interessante do que a maioria das pessoas casadas que ele conhece. Qual seria o sentido em casar, manter um bom emprego, sair de forma rotineira nos finais de semana, ter filhos, sustentá-los, vê-los crescer e sair de casa, envelhecer, se aposentar e depois esperar a morte? (by the way, Osho adoraria essa sequência :)). Esses são alguns dos questionamentos do confuso, mas consciente noivo.

E quem é chamado pela mãe da garota para resolver essa intrincada questão?? Sim, meus queridos, o Super-Clooney, aquele solteiro convicto, desalmado, individualista, defensor do desapego total. E não é que ele se sai bem no papel? Embora produza no início da conversa alguns dos diálogos mais hilários do cinema.


Mas aí, para a surpresa de todos, Clooney salva a pátria com um insight genial e que serve de mote para uma reflexão que deve ser feita por todos: “Nas suas melhores lembranças, nos momentos mais importantes, você estava sozinho? A vida é melhor com companhia”. Depois disso, preciso contar o final? :)

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